terça-feira, 6 de outubro de 2009

Enquanto isso, no tempo da “fita de arrasto…” Parte 1 – “A bendita chave da lojinha”!

FITA DE ARRASTO - 1

Certa feita eu comentava com amigos num chat que um dia eu já fui o feliz proprietário de uma gravador de rolo. Dentre esses, um amigo de nacionalidade portuguesa, e residente em Lisboa, ficou intrigado:

- “O que é um gravador de rolo?”

Expliquei do que se tratava e logo ele me disse:

- “Aqui chamamos de gravador de bobinas de fita, e antigamente se chamava gravador de fita de arrasto”.

Achei este nome ótimo, e em homenagem ao amigo de além-mar, toda vez que começar a desenterrar histórias do arco da velha, que ele tanto gosta, utilizarei este termo para denominar este tipo de postagem.

E para inaugurar esta sessão de contos da carochinha, vou desenterrar essa:

No início dos anos 80, quando eu tinha meus 14 anos de idade, mais ou menos, eu me recordo que meu primo Márcio, que mantenho mais contato (até hoje), foi trabalhar numa loja de instrumentos musicais usados. Ela pertencia a um japonês que fazia guitarras no fundo de uma casa no bairro da Lapa, em São Paulo, e o japa não podia ficar tomando conta dela na parte da tarde. Esta loja ficava no minhocaocentrão velho de Sampa, num local próximo ao elevado conhecido aqui como “Minhocão”.

Segundo ele, o tal japonês não tinha mais tempo para dividir a tarefa de dar conta da luthieria, que crescia a cada dia, e da loja de instrumentos usados. Meu primo e um amigo passavam horas na luthieria batendo papo com o ajudante do tal japonês, pois era amigo dele. Ao perceber isso, o japa ofereceu um emprego para tomar conta da loja de instrumentos a ele, que aceitou.

Mas o fato relevante aqui é que meu primo era apenas um ano mais velho do que eu e já tinha a chave de uma loja de instrumentos musicais!! rs

a-chave-do-sucesso1Para nós, simples guris que não tínhamos um tostão furado no bolso, no máximo um violão velho em casa - (mas uma paixão enorme por música - era como entregar a chave do paraíso em nossas mãos. Calma! não roubamos ou destruímos tudo, ahaha, mas o fato é que naquele tempo, quando a Teodoro Sampaio ainda não existia como é hoje, e muito menos o mercado de importados, poder ficar de frente de alguma aparelhagem, ainda que realmente velha e precária e ainda mais, com ninguém te controlando, era excitante. Apesar de adolescente, meu primo era responsável... pelo menos o suficiente, claro.onibus

Por algumas vezes eu saía da escola no meu bairro e pegava o ônibus para o centro da cidade, caminhava alguns quarteirões meio intimidantes (não como é hoje, mas já um tanto perigosos) só para poder passar algum tempo lá, batendo papo e tocando um pouco em algumas velhas guitarras, baixos e baterias por alguns minutos que fosse.

Praticamente não havia movimento nessa loja, que era única no nada esquisito endereço perdido no centrão. Lembro de passar horas lá e ninguém entrar nem pra perguntar onde ficava determinada rua. Nada mesmo!

Eis que em uma dessas visitas que fiz, meu primo, injuriado de ficar por lá sem ter muito o que fazer, resolveu talvez exercer seu lado mais rebelde e me disse algo como: “vamos ligar esta aparelhagem hoje e tocar de VERDADE!” – tocar de verdade pode ser traduzido como tocar em VOLUMES de verdade, pois sempre que ligávamos carmen ouvindo discosqualquer coisa naquela lojinha, era sempre de forma tímida, apenas pra ver como era. Mas dessa vez, seja porque ele estava entediado, seja por revolta, seja por galhofa, ele me pediu: “senta aí na bateria e pode descer o braço”. Eu comecei a tocar ainda um pouco tímido, mas ele ligou a guitarra que estava em suas mãos num velho amplificador em BOM volume e lá fui eu atrás.

Não passou mais que 5 minutos e a porta da loja estava lotada de passantes que formaram uma pequena platéia que tomou toda a foto velha piano e violino frente. Paramos após alguns minutos e alguns daqueles que ali estavam começaram a perguntar preço de algumas daquelas velhas guitarras, e lembro bem de um cidadão dizendo “eu passo aqui o tempo todo e nunca percebi que existia uma loja de instrumentos musicais nesse local”.

Numa época em que não havia nada sequer parecido ao formato mais profissional das lojas de instrumentos musicais como você conhece hoje em dia, e de suas estratégias de vendas, sem querer, exercemos nosso primeiro e bem sucedido merchandising em forma de “show ao vivo de DIVULGAÇÃO!”

Puxa, eu realmente gostaria de ter fotos disso...

Ah sim, e o tal japonês, dono da lojinha, mas que trabalhava em um fundo de quintal numa casa na lapa, era o hoje famoso Tagima. E o ajudante, que era amigo do meu primo, o hoje Luthier Jair.

abraços!

Marcos “Lelo” Craveiro